estúdios de Walt Disney, em Burbank


Tim Burton foi um garoto desajeitado. Nascido perto dos estúdios de Walt Disney, em Burbank, estado da Califórnia, ele gastava horas em frente à tevê, os olhos reluzindo filmes de ficção científica e terror. Mais tarde, já como um jovem pálido e de cabelo desgrenhado, desenhava, rodava curtas-metragens no quintal de casa e lia histórias assustadoras de Edgar Allan Poe. O cineasta completou 53 anos recentemente, em 25 de agosto. E nele ainda mora o espírito de alguém que parece compreender a vida por meio de seus tons absurdos, macabros e sombrios. Na coletânea de textos O estranho mundo de Tim Burton (Leya), críticas e reportagens de todos os filmes do diretor iluminam a carreira de um dos filhos mais excêntricos e brilhantes de Hollywood.

“Fui criado por pais de classe média e que não faziam parte da indústria cinematográfica”, declara Burton numa das entrevistas inseridas no livro, editado pelo pesquisador de cinema Paul A. Woods. “Meus pais não eram totalmente severos nem lenientes, mas agradeço a Deus por não ter sido privado de nada na infância. Ou poderia ter me tornado um assassino com um machado”, completa. A declaração é precisa: ele sempre foi um outsider na escola, um excluído que preferia seu mundinho bizarro ao convívio social. Crescido, levou o estranhamento de menino a todos os seus filmes, desde os primeiros curtas como profissional da Disney, a exemplo da animação em stop-motion Vincent (1982) e de Frankenweenie (1984), então ignorado pelo estúdio e que ele pretende relançar como longa-metragem em 2012, no mesmo formato do filme anterior.

SONHOS
Como observa o crítico David Denby num dos artigos, os diretores dos anos 1980 careciam de identidade. Ele lista alguns poucos que conseguiam fazer um trabalho com assinatura própria, como Oliver Stone, David Lynch e os irmãos Coen. A Disney também vivia um deserto criativo, o que permitiu a entrada de jovens animadores, como Henry Selick e Tim Burton — eles trabalhariam juntos, como diretor e produtor, em O estranho mundo de Jack (1993). Só que o gigante do entretenimento infantil entortava o nariz para o gosto dark de Burton. A desilusão veio cedo.

A vingança chegou por meio dos seus primeiros longas, três sucessos de bilheteria: As grandes aventuras de Pee-Wee (1985), Os fantasmas se divertem (1988) e Batman (1989). Ele se confirmava como uma promessa do cinema com produções originais e travessas, que carregavam contornos vibrantes. Seus personagens eram baseados em roteiros alheios, mas lembravam os filmes de monstros que ele via na infância: tinham aparência hostil e ainda assim pareciam frágeis e inofensivos. “Quando você se fantasia, pode deixar algo bizarro sair junto. Isso remete ao teatro grego original: tudo são máscaras”, ele explica.

Edward mãos de tesoura (1990) e Ed Wood (1994), dois dos mais elogiados pela imprensa especializada, comprovam o talento para a construção de universos ao mesmo tempo deslocados e familiares. Os sets de suas produções, aliás, têm jeito de encontro de velhos amigos, conhecidos e parentes: Danny Elfman colabora em praticamente todas as trilhas sonoras. E os atores Johnny Depp e Helena Bonham Carter, mulher de Burton desde 2001, são presenças constantes.

Os críticos mais severos sempre disseram que ele consegue, sim, criar atmosferas maravilhosas — um embate entre mundos de adultos e crianças —, mas que as narrativas deixam a desejar: Planeta dos macacos (2001) e Alice no país das maravilhas (2010) são os maiores alvos dessas reclamações. Poucos, porém, ousam desprezar as qualidades de um homem incomum (e sortudo) da indústria cinematográfica. Seus estrondosos produtos comerciais (Alice é a nona maior bilheteria de todos os tempos) soam como projetos pessoais. Como divertimento de um adolescente tímido, que se esconde atrás de câmeras caseiras e bonequinhos esquisitos.

Fonte: divirta-se

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